quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

CONTO: MUTAÇÃO

Hoje tenho a alegria de poder postar aqui um conto de um grande amigo meu, senão o melhor, Márcio Fontes da Silva, vulgo Dengue. Este texto foi publicado originalmente no Fanzine Manu Nocturna nº 1 dando uma grande força ao projeto que eu desenvolvia na época e pretendo retomar em breve.




MUTAÇÃO


    Eu nasci em um mundo onde vivo em extremo terror.
    Já perdi milhares de familiares que rumam sem saber pra onde e eu serei um deles também.
    Estou aqui esperando minha vez e meu destino é certo.
    Todos os dias me preparo para a jornada e eu sei que vou encontrar muitos obstáculos pela frente.
    Há algumas horas, uma leva de amigos deu inicio a sua jornada ao desconhecido... Nós somos assim, impacientes e lutamos para ir.
    Ninguém nunca voltou para nos contar como é.
    Vida dura essa!
    Chegou minha vez e estou ansioso.
    Caminho até a única saída existente.
    Todos dizem que é maravilhoso, mas eu tenho minhas dúvidas, ainda sou muito jovem e essa viajem é o que espero por toda vida.
    Junto comigo vai uma leva de amigos, parentes e desconhecidos, e nunca saberei o porquê de sermos muitos desta vez. A corrida vai ser cansativa...
  A pressão exercida é grande e inicia-se a Grande Corrida (maiúscula mesmo, pra dar destaque). Inconscientemente eu sei que posso morrer e sigo correndo com vários ao meu lado, e preciso ser o mais rápido. Vejo muitos se perdendo no caminho e parando.
   Corro o máximo que posso, mas minhas energias vão se exaurindo, cada vez mais...
   Sigo por caminhos estranhos e desconhecidos.
   Para chegar ao meu objetivo terei de vencer o cansaço e batalhar ainda para romper a última barreira.
   Olho ao meu lado e vejo meus muitos companheiros, exaustos, morrendo por falta de forças. Eu ainda tenho esperança e muitos ainda estão chegando... E meu momento é agora.
   Encontrei uma pequena brecha. Entro de cabeça nessa brecha e sinto que vou me desfazer...
   Vejo uma luz, e essa luz me cega.
   Entro e tenho a sensação de não ser mais eu mesmo.
   Lá na luz me sinto seguro e percebo que quem venceu fui eu.
   Encontro algo que me toma me reveste e que me acalma.
   Misturo em mim muito do que encontro ali.
   É quente, é gostoso e finalmente começo a crescer.
  Conforme passa o tempo eu entendo o porquê não tem volta. Vou mudando minha forma e aparência conforme vou crescendo, vou me transformando dia a dia aumentando meu tamanho, minha forma, minha silhueta.
  É pavorosa a sensação de ser tomado por uma força desconhecida que se funde a você, calma e lentamente.
   Vou me moldando a esse novo ambiente. Surgem novas formas, me duplico e me transformo.
   Tenho cuidado de não me perder nessas transformações...
   Vou mudando ao longo do tempo, crescendo e me cuidando.
   Fique bem maior do que era.
   Coisas novas que nem sei para que servem surgem.
   Fico maior e ouço coisas estranhas.
   Meu mundo ficar maior e mais vasto, mas fiquei só.
   Sei que no passado éramos muitos e agora sou eu dentro deste estranho mundo.
  Quando consigo me acostumar com minha nova aparência, vem novamente aquela sensação estranha do passado. Sinto meu mundo se acabando mais uma vez, e aquele “mundinho” começa a se desmanchar.
  Entro em pânico e, novamente, começo a visualizar uma luz, igual a primeira, só que muito mais forte.   Sinto a necessidade de gritar, bem forte e bem alto.
 Desta vez sou arrancado de meu mundo e entro em outro bem estranho, minha voz está engasgada, sinto uma coisa que nunca senti e muito tempo depois descubro que isto se chama dor.
 Agora vivo em um terceiro mundo e agora eu tento entender o que acontece: Deixei de ser um espermatozóide e agora todo mundo me chama de Márcio.



MUTAÇÃO
Autor: Márcio Fontes da Silva
Revisão: Roberta Nunes

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