Lembro que antes havia em mim uma espécie de orgulho próprio, mas não a tão abominável arrogância, havia apenas um orgulho por ser quem eu era e mesmo que naquela época eu não fosse nada ou fosse muito menos do que hoje. Ainda não compreendo muito daquele sentimento e acho que nunca vou compreender, pois ele perdeu-se no tempo e já não existe mais.
Sofro atualmente de uma grande confusão com meu próprio eu, não sei o que ou quem eu sou... O que eu quero? Não tenho a menor ideia, mas sei que deve haver muito mais do que passar a vida pagando contas, muito mais do que preocupações com metas, impostos e lucros de algo que não me pertence. O que existe? No momento eu não sei, mas vejo claros sinais de que há uma luz por detrás desta névoa espessa como uma mortalha.
Não quero ser panfletário, mas a verdade é que o patronado me sufoca e ao mesmo tempo me mantém, pois preciso do capital que me é pago pelo meu trabalho é ele que me mantém vivo nesta sociedade capitalista, esta remuneração é o que supre as básicas necessidades de minha família ainda que me custe parte da alma, alma esta que segundo a convenção religiosa nem a mim pertence. Esta religiosidade também não ajuda muito no quesito conforto, pois nestes tempos de ‘canibalismo administrativo-social’ o que vemos é a queda dos retos e a ascensão da injustiça, fato este que faz apenas uma máxima religiosa ter sentido “Este é um mundo de prova e expiação”. Prova e expiação aos retos e justos.
Questão filosófica: “Ou isto, ou aquilo”. Não, não é tão simples assim quando na verdade não existe a opção de escolha, na verdade nossa vida é uma sequência imperativa e desgastante de “Faça isto e faça aquilo!”. Sempre foi assim e existe uma forte tendência a ser assim para sempre, mas tenho muita dificuldade em aceitar isto... Provavelmente o mais certo a ser feito seria pender em reverência minha pesada e cansada cabeça assentindo em um eterno e submisso “Sim senhor”, seria mais fácil assim se não fosse para mim impraticável.
A bocarra está escancarada aguardo para ser alimentada, cabe a nós prover para saciar este inextinguível apetite por nossas entranhas. “Amém” e “Assim seja” para todo este invisível que nos cerca e nos comanda! Por mais que eu queira vejo que não tenho saída, aquela luz por detrás da névoa deve ser engodo, apenas uma ilusão administrada pela diretoria para enganar os rebeldes, pois assim estes terão no que pensar enquanto executam como todos os outros suas tarefas enfadonhas de sempre, dia após dia e para sempre até seu fim inevitável quando será por outro substituído.
Espere... Minha programação apresentou uma falha, mas meu software já foi atualizado e o executável corrigido fazendo de mim novamente apenas mais um. “Amém patrão, assim seja, sim senhor! Nesta organização será feito o que for de vossa vontade”.
Ópio para as massas! Tragam então meucachimbo, pois estando entorpecido e sem sonhos não sofrerei de angústia e não perceberei a irrealização desta medíocre carcaça.