quarta-feira, 20 de junho de 2012

PARA LACRIMOSA ESCREVO NA CHUVA



Escorrendo pelas telhas
A chuva faz cascata frente minha casa,
Grandes gotas caem como raios cortando o ar
E tocam o solo como terremotos.
Em manhãs como esta
Faço esforço maior para levantar da cama
E para preencher as ociosas horas, escrevo.
Escrever em monótonos dias de chuva
É para homens pequenos como eu,
Irrealizados e ociosos como eu.
Ah, se a chuva pudesse me atingir...
Aqui onde estou
Ventar um tufão e bagunçar meu cabelo,
Molhar minhas roupas
E me desacomodar deste mórbido trono
Arrancando de minha fronte
O Diadema Real da Circunspeção
E varrendo de minha mão
O gélido Báculo do Pessimismo.
Ah, se a chuva molhasse todos estes papéis
E sentisse eu tamanho frio
Que minhas mãos congelassem
E meu queixo batesse quebrando-me os dentes
E lacerando-me a língua.
Ficasse eu surdo com o som do granizo
De uma nuvem carregada
E estaria contente só por ter sido molhado.
Se houvesse um feroz vento
Que viesse como um castigo de Deus
Arrancando o telhado
E derrubando as paredes
Deixando-me exposto à chuva,
Amada carrasca, borrasca, nevasca...
Como louco escoriado
Estaria no olho do furacão
Escrevendo e gritando cada vez mais alto
Enquanto os papéis derretem e rodopiam
No ar revoltado com tamanha afronta.
Ah se houvesse tudo isso,
Se tudo ocorresse de verdade
E a chuva me lavasse e me desse açoite
Estaria salvo.
Salvo e perdoado,
Pequenino e imprestável.
Mas as únicas gotas
Que se precipitam sobre meus papéis
São as lágrimas.
Lacrimosa é minha deusa cadente,
Devotos a ela são todos os inúteis e ociosos,
Todos os ansiosos pela chuva que brota
De seus opacos olhos.
Ah, se toda a chuva pudesse me atingir...




Vagner Tadeu Firmino
17 de Março de 2.003

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